Serenata aos Mortos
Lembra do Seu Antônio lá de Serra Redonda?
Aquele que se sentava embaixo dos pé-de-figo,
Naqueles banco de madeira escura do cemitério,
E tocava violão?
Lembra dele, não lembra, compadre?
Pois é.
Seu Antônio tava todo enfeitado naquele dia.
Galante.
Camisa amarela, sapato lustroso.
Lenço vermelho no bolso da camisa.
O queixo azul.
A comadre Vera Lúcia tinha rapado aquela barbona feia dele.
Ele deixou. Naquele dia.
Pobre comadre Vera.
Seu Antônio tava lá no cemitério,
Na sombra do pé-de-figo,
Violão no colo,
Cigarro no lábio,
Água no olho.
Perguntei por que tava tão elegante:
“Tá fazendo serenata pros defunto, Seu Antônio?”
E ele me sorriu com o cigarro entre os dente:
“Tô arrumado que vou viajar
Pros braços da morena,
Que amor de São João não se apaga não!”
E tocou o violão,
Água no olho.
Pobre comadre Vera, tão devota…
Pois é, meu compadre, Seu Antônio viajou sexta passada.
Não volta mais.
Partiu com água no olho. Cigarro na boca.
O violão, Comadre Vera deixou lá no banco de madeira, na sombra do pé-de-figo, no banco do Seu Antônio.
Ninguém bota no colo.
Ninguém toca.
Tá um silêncio só.
Um silêncio que dói que só.
Serenata aos Mortos, por Paulo Moreira.